1. |
Festa
04:58
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Ouvi a festa de trás do muro do mundo
Uma sombra se formou na minha cabeça
a ideia do prazer escondido
fora de alcance
proibido
sussurrado nas gargantas do meu ouvido
dessa falta de sol e daqueles sussurros
os blocos de gelo emergem da minha cabeça
que se festejasse poderia derramar
Ouvi a festa de trás do muro do mundo
Ergo a cabeça e começo a escalar
atrás da festa de trás do muro
atrás da festa do mundo
A festa é um lugar nunca tocado pelo sol
nunca tocado por sequer um raio de sol
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2. |
Espera
04:52
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O dia inteiro sentado olhando pra esse quadrado
e o mundo ansioso em toda imensidão nunca fica parado
nada acontece como se ele soubesse, como se ele soubesse
Que eu preciso esperar
eu tenho que esperar
As coisas me atropelam
dedico pouco tempo pra nós dois
hoje eu quero dormir um pouco mais
vou correr pra dormir mais
Hoje eu não vou me atrasar
Eu preciso esperar
eu tenho que esperar
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3. |
Trauma
04:05
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Xícaras estilhaçadas de chá
um corpo inchado de açúcar
sangue preto de homem coagulado
vago mais
Eis o cenário em que me vi
sem saber da tragédia que ocorrera por ali
panos sujos de louça
quatro pés em escorço no dorso de um bairro calmo
a quantos palmos se esconde a bagunça
onde eu despejo os cacos de trauma?
Daqui eu não saio.
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4. |
Infância
04:16
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Subi na prateleira e puxei meu passado
um livro velho escrito todo errado
marcado em trechos longos, marca-páginas dobradas
com folhas secas e eu fotografado
em tantas séries e com tanta gente que eu nem sei quem são
memórias resistentes, lembranças que não se vão, então
eu vou vagar por ele, eu vou soprar o pó
tirar essa poeira daqui pra entender melhor
eu lembro de andar em cima do telhado
trepar na goiabeira que crescera logo ao lado
catar jabuticaba no pé do vizinho
jogar pedra no rio brincando de reizinho
correr pra todo lado sem temer se machucar
voltar todo ralado, calado pra ninguém notar
eu cavo o meu passado pra me encontrar nesse buraco
e entender melhor
no pasto eu aprendi que o quero-quero tira lasca
se lasca quem não leva guarda-chuva nessa caça
a árvore de ingá no meio da pastagem
só herói chega até ela, só quem tem coragem
e é por isso que eu andava com o boneco do Shun
preferia Cavaleiros a Castelo Rá-tim-bum, jogava bola
até gastar a sola no concreto
descalço mesmo, sem pensar demais no que é correto
Mas velho, toda a criançada era santa de verdade
a gente ia pra igreja, ninguém fazia maldade
mas isso só até a metade do colegial
quando chegou a idade em que isso não é mais normal
alguns continuaram no caminho da pureza
eu tenho amigo de infância que virou pastor da igreja, ou seja,
gostaram tanto dessa pureza que se sente quando é criança
que montaram acampamento ali mesmo, no mundo da infância
Se eu olhar pra trás do tempo do “era uma vez”
as coisas perdem nitidez quando eu tinha uns cinco ou seis
o bairro em que eu morava não tinha edifício nem asfalto
todo alarde era alarme falso
e nesse tempo eu nem sabia se era certo ou errado
quando eu fazia uma besteira ninguém era culpado
entendo essa galera que ficou no acampamento, mas lamento,
olhei pra frente e hoje eu tento ir com o vento
Ando com a barraca enrolada na mochila
e só acampo pra dormir ou pra tomar um chá de camomila
carrego o que presta e o que não presta eu jogo fora
pra não pesar eu jogo até dinheiro fora
porque a Terra corre solta, gira aflita enquanto muda
e a gente segue montado no casco da tartaruga
vou riscando as páginas desse meu livro velho
contando tudo o que faço, do berço ao cemitério
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5. |
Treta
04:01
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Sentenciados e julgados
de hoje não passarão
os homens, suas malas e machados
desarmados aqui serão
Os ternos rasgados
e os carros queimados
redenção
Eu acredito na treta
na treta, na treta
sente o molotov queimar
Eu acredito na treta
na treta, na treta
desfigurar a imagem
será lançado à margem
não vai ter mais vantagem sobre nós
Não tem graça
ruína causando mais desgraça
o que eles querem é fazer barulho
encher o vazio de ideias de entulho
O que importa é perverter a palavra
porque nem sequer tentaram entender
O que importa é firmar a certeza
em nome de uma suposta “lei da natureza”
A perversão
tá em acusar o outro de tentar manipular
enquanto ele mesmo manipula
e com essa carapaça te faz vestir a carapuça
E vem me acusar de impor um pensamento
enquanto ele que se esforça a todo custo
para barrar qualquer pensamento
impedir o diálogo e denunciar o outro
pelo ato que ele próprio cometeu
É nessa repetição, nesse circo de horrores
que seguem fazendo todos os discursos vendedores
invocando qualquer clichê bíblico que os ocorra
lembrando de Adão e Eva, Sodoma e Gomorra
e, porra, abusam sem dó de deus e do mundo
se fazendo de santos em suas promessas imundas
chafurdam no absurdo das pérolas que arrecadam
arrebatam almas na pocilga em que nadam
você vê todo dia, sabe do que eu falo
na tevê, no facebook, em casa e no trabalho
que eles abusam do próprio deus do qual se valem
quanto é que eles valem?
abusam do próprio deus
Eu acredito na treta
na treta, na treta
sente o molotov queimar
Eu acredito na treta
na treta, na treta
desfigurar a imagem
será lançado à margem
não vai ter mais vantagem sobre nós
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6. |
Bairros
03:28
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Por onde essas solas tão desgastadas me levam
ando por um chão folheado de outono e descaso
me satisfaço com a polidez da gente do bairro
e imprimo sem tinta o meu sapato por onde passo
a cidade é um gomo pequeno na bola do mundo
e nesse asfalto-gramado a gente vive junto
minha meia tá furada, minha camisa não tem número
minha chuteira não atola, não tem trava na sola
Na cidade do bom gosto
molhada de garoa quente
as ruas seriam compridas
não teriam nome de gente
Se bem que de fumaça e desaforo
faz tempo que o céu de São Paulo engole o choro
pra secar mais cimento no chão
Mas ciscando esse pavimento
o galo do bairro arrebenta
arranha a superfície dos sonhos em andamento, eu lamento
E quando eu vou pra longe de você
a angústia me devora
criei raízes e não quero ir embora
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7. |
Escuridão
05:25
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tá tudo escuro e eu tenho medo
queria que fosse mais cedo
podia estar com você ou mais gente
tenho medo dos monstros e serpentes
com você daria pra correr junto
de bike a milhão a gente passa voando
até quando não desse mais pra ver lá no fundo
vou ficar aqui parado até quando?
eu acho que eu não mando mais no meu coração
parece que ele vai sair pela boca
eu respiro fundo e me jogo na escuridão
me lanço sabendo que não é seguro
me perco no escuro
me perco no escuro
prevejo a correia da bike soltando
me vi derrapando e caindo no asfalto
joelhos ralados e falta de ar
me resta esperar o destino chegar
um túnel de piche me separa do outro lado
a lua sinistra não clareia o bastante
meus olhos abertos parecem fechados
eu respiro fundo e me jogo na escuridão
me lanço sabendo que não é seguro
me perco no escuro
me perco no escuro
com você daria pra correr junto
e o que eu não daria pra que fosse mais cedo
me lanço sabendo que o caminho não é seguro
me perco no escuro
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8. |
Sargas
02:33
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Godasadog São Paulo, Brazil
Godasadog é um duo formado por Victor Meira e Matschulat.
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